Violência doméstica e feminicídio crescem no Pará; saiba onde e como denunciar

A partir de hoje até sexta-feira 8, Dia Internacional da Mulher, o Roma News publica uma série de matérias em homenagem à mulher. Segundo levantamento da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup), os casos de violência contra a mulher e feminicídios cresceram 8,1% e 5,5%, respectivamente, no...

Publicado em 26 de junho de 2024 às 14:28

A partir de hoje até sexta-feira 8, Dia Internacional da Mulher, o Roma News publica uma série de matérias em homenagem à mulher. Segundo levantamento da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup), os casos de violência contra a mulher e feminicídios cresceram 8,1% e 5,5%, respectivamente, no último ano.

Apenas as notificações de lesão corporal se aproximaram da marca de 11 mil denúncias em 2023. Atualmente, o Brasil ocupa o quinto lugar no ranking mundial de feminicídios, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). Além disso, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alerta que uma em cada três mulheres é submetida à violência física ou sexual ao longo da vida.Os dados apontam que as situações e processos de violência começam desde cedo, pois a OMS projeta que uma em cada quatro mulheres jovens (de 15 a 24 anos) que estiverem em um relacionamento já terão sofrido violência de seus parceiros por volta dos 20 anos. As violências tendem a ser causadas por parceiros íntimos e dentro da moradia das vítimas.

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Sobrevivência

M.S, vítima de violência doméstica (que será identificada por iniciais e nome fictício para preservação da sua identidade), narra que seu agressor, com quem viveu por 15 anos, tinha um comportamento inicial considerado comum para a idade, mas que depois se revelou perigoso ao longo da vida conjugal.

'Eu tinha 15 (anos) e ele 18 quando nos conhecemos, amigos de amigos, sabe? A gente ia para os mesmos lugares e tudo era um sonho. Ele ia me buscar na escola, ficava de olho nos meus colegas e, aos poucos, foi me falando que não era bom ficar perto de alguns deles, e eu fui dando um ‘chega pra lá’, pra mim, aquilo era cuidado'.Ela cita que, com o passar dos anos, o fortalecimento da relação levou o casal a tomar a decisão de viver junto, mas com a chegada da primeira gravidez e a necessidade de parar de trabalhar para se dedicar à gestação de risco revelou algo que ela ignorava até então: o parceiro ficava mais violento a cada dia.

'Quando a gente namorava, às vezes ele dava uns tapas e derrubava algo que eu estava segurando e eu achava aquilo normal, que era uma brincadeira…. Até o dia em que, durante uma discussão, não olhei pra ele e levei o primeiro tapa no rosto. Eu me assustei, mas achava que estava errada, que eu tinha ‘tirado ele do sério’ e que aquilo tudo foi só nervosismo', diz.

M.S conta que ficou preocupada após a primeira agressão, mas achou que tudo se resolveria no fim da gravidez e início da convivência com o primeiro filho do casal, o que não aconteceu. 'Depois das brigas ele vinha todo carinhoso pedindo desculpas e perguntando se cheguei a contar para alguma amiga ou para alguém da família sobre tudo. Assim que contava que tinha recebido conselho de alguém, ele se irritava e fazia eu me afastar da pessoa, dizendo que não queria o bem da nossa família. Eu jurava que tudo ia melhorar com a chegada do nosso filho, mas a gente acabou sofrendo junto', lembra.

A vítima relata que, a cada nova discussão, a gravidade dos machucados físicos e das marcas sentimentais se agravavam. Após o nascimento do primeiro filho, ela foi proibida de sair à rua, pois uma nova crise de ciúmes poderia acontecer a qualquer momento e ela poderia ser agredida em qualquer lugar. Meses depois, M.S descobriu que estava esperando o segundo filho, mas perdeu o bebê nos meses iniciais, durante uma briga do casal, onde o primeiro filho também foi ameaçado.

'Ele não queria que eu falasse com a minha mãe sobre as coisas que aconteciam, mas um dia ele leu partes de uma conversa no celular. Fui agredida com socos, chutes, tapas, fui jogada contra a parede. Com toda confusão, meu filho começou a chorar cada vez mais alto e quando ele foi para cima dele, eu tive coragem de pegar algo e bater nele, jogar no chão mesmo, e sai correndo com meu filho pela rua. Recebi ajuda de amigos de uma vizinha, que me levaram ao hospital e à Delegacia. No meio disso tudo, comecei a sangrar e falaram que estava perdendo o segundo filho. Voltei ao hospital e fiquei pensando o que faria da minha vida', recorda.

Na Delegacia, a vítima formalizou uma denúncia pela Lei Maria da Penha, entrou com uma medida protetiva e recebeu ajuda de amigos e familiares para recomeçar a vida em outra cidade. M.S destaca a importância da denúncia: 'Dói recomeçar, não conhecer absolutamente ninguém; ter que aprender a confiar nas pessoas novamente do zero, mas eu precisava fazer isso pelo meu filho: não só pelo que está comigo até hoje, como pelo que não pôde nascer. Esse recomeço não é só por mim, é por eles. Se você não tem forças para sair dessa situação sozinha, comece pelo menos, pelos seus filhos, para garantir que eles não passem pelo mesmo e aprendam que ser humilhado e agredido pela pessoa que diz te amar não é normal', conclui.

Acolhimento

Desde 2020, o Governo do Estado vem desenvolvendo o Programa ‘Entre Elas’, que acolhe mulheres vítimas de violência doméstica. A iniciativa dispõe de uma equipe de profissionais que oferece um espaço seguro para que estas mulheres possam compartilhar suas vivências e se ajudar mutuamente no enfrentamento de problemas couns. Desenvolvido pela Fundação ParáPaz, a iniciativa vai além do atendimento emergencial pós-violência, realizando uma busca ativa por mulheres em situação de vulnerabilidade social em rodas de conversa na Região Metropolitana de Belém e cidades do interior.

A coordenadora do ‘Entre Elas’, delegada Claudilene Maia, conta que o principal meio de acesso ao programa é pelas rodas de conversa que o ParáPaz proporciona, principalmente nas Ações Cidadania, que o governo do Estado realiza em todos os municípios. 'Através dessas ações garantimos um horizonte mais digno na vida de cada uma, dando apoio para que se desenvolvam e possam seguir o caminho que as levem para um futuro melhor, sem violência, e defendendo as suas necessidades', diz.

Como denunciar?

As denúncias de violência podem ser feitas para o número 180, onde a ligação é gratuita e o anonimato, garantido. Nele, qualquer pessoa pode denunciar. Mulheres vítimas de violência também podem acionar a polícia pelo número 190 ou ir presencialmente até a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam).

Para quem vive em Belém, as denúncias de violência doméstica e outras violações dos direitos humanos também podem ser feitas pelo aplicativo SOS Mulher, desenvolvido pela Prefeitura de Belém em parceira com o Tribunal de Justiça do Pará (TJPA). As denúncias vão direto para a Guarda Municipal, que faz a averiguação dos casos. O aplicativo está disponível para os sistemas Android e iOS.