Publicado em 9 de março de 2025 às 01:09
O Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março, é um momento de reflexão sobre as lutas e conquistas femininas ao longo da história. No entanto, alguns temas, como a violência patrimonial, ainda passam despercebidos e precisam ser debatidos para que mais mulheres tenham conhecimento sobre seus direitos. >
Conforme a Lei n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), a violência patrimonial é caracterizada por qualquer ação ou omissão que comprometa a integridade dos bens e recursos econômicos da mulher. Isso inclui desde a destruição de objetos pessoais e retenção de documentos até o controle financeiro abusivo e a proibição de trabalhar ou estudar. O objetivo dessas práticas é limitar a independência financeira da mulher, mantendo-a sob o domínio do agressor. >
Embora essa forma de violência seja uma realidade para muitas mulheres, a subnotificação ainda é alarmante. Em 2020, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (atualmente Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania) registrou somente 3 mil denúncias relacionadas a crimes contra a segurança financeira das mulheres. Esse número contrasta com as 106,6 mil denúncias de violência psicológica no mesmo período, evidenciando a falta de reconhecimento desse tipo de abuso. >
Dados mais recentes de 2024 revelam que, entre denúncias, pedidos de ajuda e esclarecimentos via telefone e WhatsApp, a Central de Atendimento à Mulher (180) registrou 750,7 mil atendimentos. Em média, foram 2.051 chamados por dia. Desses, 132.084 foram denúncias de violência contra a mulher, representando um aumento de 15,2% em relação a 2023. Das denúncias realizadas, 83.612 partiram das próprias vítimas, 48.316 foram feitas por terceiros e 156 pelo próprio agressor. >
“Apesar do aumento das denúncias, a violência patrimonial ainda é pouco compreendida e muitas vezes negligenciada. O desconhecimento sobre esse tipo de agressão faz com que inúmeras mulheres permaneçam em situações abusivas sem perceberem que estão sendo vítimas de um crime”, declara a fundadora e CEO do Instituto Mulheres do Imobiliário, Elisa Rosenthal. >
Segundo ela, isso contribui para manter o ciclo de violência contra a mulher. “O controle sobre a vida financeira, a manipulação de bens — como imóveis da família — e a dependência forçada impedem que muitas mulheres rompam com o ciclo da violência, dificultando sua autonomia e segurança”, acrescenta. >
Identificar esse tipo de abuso pode ser um desafio, pois muitas vezes ocorre de forma sutil e progressiva. No entanto, alguns sinais indicam que uma mulher pode estar sendo vítima de violência patrimonial, são eles: >
“Vale lembrar que, em muitos casos, o agressor age de forma sutil, controlando todas as finanças da família, deixando a mulher sem recursos para suas necessidades básicas ou para buscar ajuda, o que vai silenciosamente minando sua autoestima. Além disso, a destruição de bens pessoais e a retenção de documentos impedem a mulher de exercer sua cidadania plena e de se inserir no mercado de trabalho”, destaca a psicanalista e planejadora financeira pessoal, especialista em gestão financeira familiar, Adriana de Arruda. >
O primeiro passo é reconhecer o abuso. Muitas mulheres não percebem que estão presas em um ciclo de violência patrimonial, já que o controle financeiro excessivo e a destruição de bens podem ser mascarados como “cuidados” ou “gestão financeira familiar”. >
Ao identificar a situação, é essencial buscar apoio jurídico . Registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia da Mulher ou em uma delegacia comum é um passo fundamental para garantir proteção. A Lei Maria da Penha prevê medidas protetivas para resguardar os bens da vítima. >
“Buscar a Defensoria Pública ou um advogado especializado em direito de família também é importante para garantir o divórcio, a divisão justa dos bens e patrimônios, e assegurar direitos como pensão alimentícia e partilha de bens, como imóveis”, orienta Elisa Rosenthal. >
Ter um plano de segurança também é essencial. Separar documentos importantes e contar com o apoio de amigos ou familiares pode ser determinante para sair da situação de abuso. “Saber para onde ir em caso de emergência é um passo fundamental para garantir segurança e proteção”, acrescenta Adriana de Arruda. >
No aspecto financeiro, abrir uma conta bancária independente e impedir o acesso do agressor ao salário ou outros recursos é uma estratégia essencial para recuperar a autonomia. Caso haja movimentações suspeitas em contas conjuntas, é possível solicitar auditoria bancária e buscar medidas legais para proteger o patrimônio.“Além disso, organizações especializadas auxiliam mulheres a reconstruírem sua independência econômica, oferecendo suporte jurídico e capacitação profissional”, ressalta Adriana de Arruda. >
Para Adriana de Arruda, uma das formas de enfrentamento desse problema é por meio do acesso à educação financeira . “Quando uma mulher entende como gerenciar seu dinheiro, criar uma reserva de emergência, evitar endividamentos abusivos e fazer investimentos estratégicos, ela reduz sua vulnerabilidade e se fortalece contra possíveis abusos financeiros”, pontua. >
Programas de educação financeira voltados para mulheres ensinam desde conceitos básicos, como planejamento de gastos e orçamento doméstico, até temas mais avançados, como investimentos e direitos financeiros. >
“Essas iniciativas frequentemente trabalham aspectos emocionais e comportamentais, ajudando as mulheres a identificarem padrões de controle financeiro em relacionamentos abusivos e a tomarem medidas para recuperar sua independência”, completa Adriana de Arruda. >
A violência patrimonial tem efeitos devastadores na saúde mental das mulheres, comprometendo sua autonomia e gerando um sofrimento psicológico intenso. “O medo da instabilidade financeira e a falta de controle sobre os próprios recursos criam um estado constante de ansiedade e estresse. Além disso, a perda da autonomia financeira pode levar à desmotivação e a sentimentos de impotência, favorecendo quadros de depressão e falta de esperança no futuro”, afirma a psicanalista e presidente do Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino (Ipefem), Ana Tomazelli. >
Segundo ela, a dependência financeira também impacta diretamente a autoestima e a segurança emocional da mulher, minando sua confiança nas próprias decisões. “Muitas vítimas passam a viver em estado de alerta, desenvolvendo transtornos de ansiedade, crises de pânico e até fobias relacionadas ao medo do abandono e da privação material. O desgaste emocional prolongado pode resultar em exaustão mental e burnout, afetando a produtividade e a qualidade de vida”, explica. >
Grupos de mulheres, ONGs, associações e projetos sociais oferecem suporte jurídico, psicológico e financeiro, auxiliando vítimas de violência patrimonial a retomarem suas vidas com mais segurança e dignidade. “Esses espaços permitem trocas de experiências, acesso a informações e encaminhamentos para profissionais capacitados, promovendo um ambiente acolhedor e encorajador”, complementa Ana Tomazelli. >
Portanto, investir na educação financeira feminina e fortalecer redes de apoio não apenas ajudam a combater a violência patrimonial, mas também empoderam as mulheres para que possam construir um futuro com mais liberdade, segurança e independência. >
Buscar apoio em instituições especializadas, como a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, a Defensoria Pública e delegacias especializadas no atendimento à mulher é extremamente importante para combater a violência patrimonial. É necessário que a mulher saiba que ela não está sozinha e que existem caminhos para recuperar sua autonomia e segurança financeira. Por Letícia Carvalho >