Publicado em 28 de agosto de 2024 às 11:53
Do litoral paulista às praias do nordeste, o mar dá sinais rápidos de avanço e aumenta a tensão de quem se acostumou a viver nesses locais por décadas e que agora vivencia a mudança brusca das paisagens. O que antes ficava, apenas, no campo das projeções e previsões ambientais já faz parte do dia a dia de milhares de pessoas que vivem ao longo dos mais de 7,4 mil km de faixa costeira no país. O avanço do mar sobre faixas de areia e propriedades particulares já é realidade em alguns locais do litoral brasileiro.>
No dia 20 de agosto, mais uma casa foi destruída pela força das águas do mar na Praia do Saco, em Estancia-SE, cidade que fica a 70 km de Aracaju. Segundo o proprietário, um médico de Aracaju, a casa já havia passado por um reforço da estrutura. Foi contratado um serviço para colocar manilhas cheias de concreto, muro de alvenaria e reforço de pedras pelo lado interno, mas a força da maré levou tudo.>
O presidente da Associação Comunitária de Moradores da Praia do Saco, Camilo de Lelis Ramos, diz que viver na região virou sinônimo de “tensão eterna”. “A situação está mudando rapidamente. Onde o mar chegou, ele não recuou mais. Só avançou”, descreve ele.>
“O mar levou tudo, como se fosse açúcar. Se você visse como ficou, você não acreditaria. Fizemos cinco espigões na praia para segurar a água, mas o mar já levou três deles. A força da água é um espetáculo bonito de ver, mas de viver, não. O coração aperta. Quando chegamos aqui, era a maior paz, com faixa de areia extensa. Hoje sabemos que é questão de tempo. Pelo menos, 60 casas estão com os dias contados”, relata Camilo.>
Além desta, pelo menos outras 14 foram atingidas e desocupadas no local, nos últimos anos, em razão do avanço do oceano. Já há algumas décadas, os moradores e pescadores da Praia do Saco lidam com os prejuízos causados pelo avanço do mar. Ao longo do tempo, eles adotaram medidas para conter a água e proteger as propriedades, como a implantação de barreiras de pedra, mas tudo foi sendo levado pela força da maré.>
O poder público está sendo constantemente desafiado, sobre quais medidas tomar diante desta situação, que aumenta o temor em relação ao que está por vir. Na última terça-feira, 26, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, emitiu um alerta global sobre o tema.>
Locais no Brasil que já enfrentam o avanço do mar>
No Brasil, as consequências já geram prejuízos. Além de Sergipe, vários outros locais do litoral brasileiro já enfrentam as consequências do avanço do mar.>
Confira alguns deles, abaixo:>
No Ceará, um dos casos mais emblemáticos é o da cidade de Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza. Estudos apontam que as praias de Pacheco e do Icaraí perderam, em média, em torno de 5 metros de faixa de areia por ano, nas últimas décadas. Famosa pelas barracas de praia, festas de carnaval e zona de surfe, a Praia do Icaraí teve mais de 20 barracas destruídas pelo avanço do mar, além de propriedades privadas e edificações públicas – um prejuízo estimado em cerca de R$ 10,7 milhões.>
Diante do quadro, a prefeitura criou em 2018 o Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima do município e adotou algumas medidas, em parceria com o governo do estado, como a construção de espigões para conter o avanço do mar.>
Em 2020, a maré avançou de tal modo sobre a avenida litorânea que destruiu grande parte do asfalto, gerando enorme prejuízo para o município. Foi depois disso que a administração local decidiu implantar os espigões. Hoje, eles já estão no local, mas a população vive em estado de alerta constante.>
Além de Caucaia, outras 10 cidades do Ceará já enfrentam consequências geradas pelo avanço do mar. São elas: Camocim; Jericoacoara; Acaraú; Flecheiras; Paracuru; Fortaleza; Icapuí; Aracati; Beberibe e Fortim.>
A erosão costeira atinge, também, algumas praias da Paraíba. Na capital João Pessoa, por exemplo, já houve registros de queda de falésias nas praias de Cabo Branco e Seixas. O mesmo aconteceu em cidades como Conde e Pitimbu, no litoral sul do estado. Na parte norte, o registro mais simbólico ocorreu no município de Baía da Traição, onde dezenas de casas já foram derrubadas pela força da maré. O problema já é antigo e tem se agravado com o passar do tempo.>
Só no primeiro semestre do ano passado, 22 residências foram destruídas pelo mar, especialmente nas proximidades do calçadão da Praça José Barbosa, que é a principal da cidade e que já foi atingida pelo mar diversas vezes. O município chegou a declarar estado de emergência em mais de uma ocasião.>
Em Peruíbe, no litoral paulista, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística avalia a instalação de sacos de areia para segurar o mar em uma das pontas da Barra do Una. O local passa por erosão costeira e, onde antes era protegido por vegetação, agora está tomado por areia e água.>
As projeções mais recentes, como as da ONG norte-americana Climate Central, indicam que todas as cidades do litoral de São Paulo correm risco de terem parte da área urbana invadida pelo mar. Desde os anos 1950, segundo o Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), o mar já subiu cerca de 20 centímetros na região.>