Publicado em 3 de março de 2025 às 08:06
O Pará vai levar toda a força amazônica para a COP-30. A Conferência Mundial do Clima, que será realizada em Belém em novembro de 2025, será sem dúvida uma grande vitrine para o mundo, a oportunidade perfeita para nossas instituições de pesquisa apresentarem o que há de mais novo em termos de tecnologia sustentável eminentemente amazônica. A Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Rural da Amazônia (Ufra), Museu Emílio Goeldi e outras instituições de pesquisa certamente vão apresentar projetos voltados para práticas sustentáveis.>
Com este intuito, o professor titular da Faculdade de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFPA e pesquisador em Bioenergia Nélio Teixeira Machado, já está com o dever de casa pronto para levar soluções ambientais pensadas e produzidas na própria Amazônia para o mundo, na tentativa de sensibilizar investidores a aderirem a novas práticas ambientais sustentáveis e mais benéficas para o Planeta.>
É com esse espírito que o professor Nélio Teixeira Machado tem na manga um projeto de pesquisa já em fase final, pronto para se transformar em protótipo, que utiliza caroços de açaí e de tucumã para a produção da chamada “gasolina verde”, ou seja, gasolina ambientalmente sustentável, pelo fato de utilizar como matéria-prima biomassa, não derivando portanto do petróleo, um combustível fóssil. A mesma tecnologia também é utilizada na produção do “bioasfalto” e do “querosene verde” de aviação, fontes de energia sustentável e renovável.>
O projeto – batizado de Sustenbioenergy/CNPq - será apresentado na COP-30 como iniciativa individual do Laboratório de Transformação e Valorização de Resíduos: Sustentabilidade, Biorrefinaria, Bioenergia e Bioprodutos, vinculado à UFPA. A pesquisa tem caráter multidisciplinar e multi-institucional, desenvolvida em conjunto pela UFPA, Unifesspa (Universidade do Sul e Sudeste do Pará), UFAM (Universidade do Amazonas), UEA (Universidade Estadual do Amazonas), UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e IME-RJ (Instituto Militar de Engenharia).>
Segundo Nélio Machado, o projeto tem como objetivo a valorização das cadeias do açaí, no Pará, e do Tucumã, no Amazonas, através da transformação dos resíduos em tecnologias, processos e produtos. No caso do Pará, a matéria-prima utilizada são os caroços de açaí, enquanto no estado vizinho do Amazonas a pesquisa obteve o mesmo resultado, mas a partir da utilização de caroços de tucumã.>
“Do açaí, nós fazemos um bio-óleo rico em hidrocarbonetos, que após processamento é transformado em gasolina verde, querosene verde de aviação, diesel leve verde, diesel pesado verde e em bioligante asfáltico, que tem as mesmas propriedades do bioligante asfáltico de petróleo, dando origem portanto a um bioasfalto verde”, explica, acrescentando que a pesquisa também permite a produção de biogás rico em metano e etano, podendo-se gerar energia com este biogás e ainda produzir um biocarvão, que, “após ativação química e térmica, pode ser utilizado, por exemplo, na fabricação de biofiltros para comunidades isoladas e usados na desinfecção de água subterrânea, ou seja, da água do poço usada nessas comunidades”, revela.>
O projeto teve origem com uma tese de Doutorado, em 2016, e já vem sendo trabalhado praticamente durante dez anos, entrando hoje numa fase de transferência de tecnologia para o setor produtivo. Na atual fase, diz o pesquisador Nélio Machado, “nós estamos procurando um investidor, através de uma Parceria-Pública-Privada (PPP), ou de uma parceria pública, para instalar protótipos em comunidades isoladas ou na Região Metropolitana de Belém (RMB). Não se trata mais de um projeto de pesquisa básica, mas de um projeto de inovação”, observa.>
O pesquisador tem noção de que a indústria petrolífera está muito bem estabelecida e que detém um “monopólio gigantesco” sobre os combustíveis, mas ressalta que “não podemos também esquecer que o Brasil é o país que tem a maior diversidade de matriz energética no mundo, com percentual de energias renováveis de aproximadamente 35%”. Nesse contexto, destaca, “nós temos abertura para furar esse mercado”.>
Nélio Machado enumera três grandes “joias” que facilitam para que o projeto tenha maior probabilidade de inserção no mercado de consumo: o bioasfalto, a “gasolina verde” e o querosene de aviação sustentável. Ele diz que é importante ressaltar, no entanto, que tudo o que se pode fazer a partir do petróleo, um combustível fóssil, também se pode fazer a partir dos processos de transformação termoquímica de biomassa lignocelulose. “O que nós temos aqui é uma petroquímica verde sustentável e renovável, porque eu estou usando biomassa residual, enquanto o petróleo não é renovável”, compara, lembrando outro aspecto de suma importância: “Eu não corto nenhuma árvore, só utilizo resíduos de cadeias produtivas agroindustriais estratégicas. O importante é que tudo o que eu produzo com combustível fóssil, na petroquímica eu posso fazer com a biomassa residual de base lignocelulose”.>
Outros pontos a serem destacado para que esses produtos ganhem mercado são o fortalecimento das cadeias produtivas, da bioeconomia, da economia circular e a preservação da biodiversidade, o que confere várias bases ambientais e tecnológicas que demonstram a competividade dos produtos ambientais no mercado.>
Para comprovar de que os produtos verdes podem muto bem serem inseridos no mercado, Nélio Machado cita como exemplo uma tese de Doutorado concluída em dezembro de 2024 pelo Prof. Dr. Professor Benedito Franciano, do Instituto Federal do Pará (IFPA) – Campus Abaetetuba, vinculado a um programa de pós-graduação da UFPA, cujo tema central é a análise da viabilidade técnico-econômica do processo de produção de biocombustíveis, biogás e biocarvão a partir dos caroços de açaí. “Nós provamos – isso foi avaliado por pares internacionais – a viabilidade econômica”, ressalta.>
Diante de todos estes fatos, o professor Nélio Machado chama atenção para o fato de que não se trata mais de um projeto em desenvolvimento, mas que já está numa fase de implantação. “Nós já temos todo um estudo da cadeia completa, de todos os subprodutos, de todas as tecnologias e a avaliação econômica para dizer que nós queremos que o Estado, ou com uma Parceria Público-Privada, possa construir um protótipo para ser utilizado como modelo, que seria avaliado pelos investidores para uma escala de produção real”, diz o pesquisador, dando o seu recado para os futuros participantes da COP-30. Hoje, diz ele, “já temos empresas no Rio e São Paulo que constroem máquinas que podem fazer o processamento dos caroços de açaí, não seria necessário importar”.>
A partir de todo o trabalho desenvolvido, a expectativa é de que a COP-30 possa realmente ser a vitrine esperada e que iniciativas sustentáveis produzidas na Amazônica, utilizando produtos da própria região, possam beneficiar não somente os povos amazônicos, mas todo o Planeta, levando não somente a uma reflexão sobre o modo de produção atual, mas à adoção em escala global de práticas sustentáveis que possam realmente fazer a diferença e contribuir não apenas para a preservação ambiental e consequente melhoria da qualidade de vida, mas para uma reflexão pessoal que possa modificar hábitos individuais e se espalhar como prática coletiva em prol do bem comum.>
Lázaro Moraes - Especial para o Portal Roma News>