Guilherme Paraense, primeiro medalhista de ouro na história dos Jogos Olímpicos, será reconhecido ‘Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro’

O paraense deve se tornar “Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro”. O título ao atirador esportivo paraense tem o peso equivalente ao dado para Alberto Santos Dumont (1873-1932) por sua representatividade na aviação nacional.

Publicado em 26 de julho de 2024 às 16:29

Guilherme Paraense deve se tornar "Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro"
Guilherme Paraense deve se tornar "Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro" Crédito: Reprodução

Natural de Belém e militar do Exército, o primeiro competidor a conquistar uma medalha de ouro para o Brasil está próximo de entrar para a história como “Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro” desde o início da Era Moderna.

O título ao atirador esportivo paraense tem o peso equivalente ao dado para Alberto Santos Dumont (1873-1932) por sua representatividade na aviação nacional. A partir dos Jogos Olímpicos de 2028, em Los Angeles, nos Estados Unidos, já será possível ostentar o título de patrono.

Segundo a lei nº 12.458, de 2011, para se tornar patrono ou patroa, o critério leva em conta a representatividade da personalidade na sociedade em atuações de destaque e de interesse nacional.

No último dia 7 de julho, o projeto de lei 723/2022, que tramita na Câmara dos Deputados envolvendo Guilherme Paraense, obteve parecer favorável do relator na Comissão de Cultura (CCULT), o qual será votado em agosto no mesmo colegiado.

De autoria do deputado Raimundo Santos (PSD-PA), o projeto de lei, em seguida, vai passar à Comissão de Constituição e Justiça e da Cidadania (CCJC) da Casa e seguirá para avaliação em comissões do Senado Federal. A proposição não deve passar por votação em plenário, por ser conclusiva para sanção nessas comissões.

“Guilherme Paraense é um herói nacional, e torná-lo Patrono do Esporte Olímpico Brasileiro não significa apenas uma homenagem justa à sua façanha na Bélgica ao trazer a nossa primeira medalha de ouro, a única até hoje em sua modalidade, mas a quitação de um débito à sua memória e um resgaste necessário da própria história desportiva brasileira”, justificou o parlamentar.

“Com a patente de tenente do Exército Brasileiro, Guilherme Paraense, cujo nascimento entra no 140º aniversário justamente agora em 2024, é o nosso maior herói do esporte de tiro esportivo, um caminho pavimentado por desempenhos gloriosos e recentes de atletas de peso como Felipe Wu, Cassio Rippel, Emerson Duarte, Janice Teixeira, Júlio Almeida, Daniela Carraro, Roberto Schimits e Rodrigo Bastos”, diz um trecho do projeto.

Em outro ponto, informa que “Guilherme Paraense foi, de fato, o personagem central do que pode ser considerado como uma epopeia”. A equipe que ele compôs, diz o levantamento, “viajou por conta própria e enfrentou diversas dificuldades nas instalações de terceira classe no navio ‘Curvello’, cujos camarotes eram pequenos e quentes, sem ventilação, obrigando que todos dormissem no bar da embarcação, na qual tinham de aguardar que o último cliente saísse para que pudessem descansar”.

Após a constatação de que não chegaria a tempo de competir, a equipe de tiro resolveu tomar um trem de carga na cidade de Lisboa, em Portugal, e mesmo em condições precárias seguir viagem à mercê de intempéries.

Para agravar a situação, os atletas foram furtados em Bruxelas, ficando em munição e os alvos. Segundo a história, na Antuérpia, eles teriam recebido ajuda de competidores norte-americanos, que emprestaram armas mais modernas, fabricadas pela famosa marca Colt, mas existe controvérsia nessa versão.

No dia 3 de agosto de 1920, com seus 36 anos, Guilherme Paraense conquistou a medalha olímpica na prova de pistola rápida, em um tiro perfeito de 30 metros. Ele também conquistou o bronze por equipe na prova de pistola livre.

Na bagagem, o Brasil trouxe medalhas de ouro, prata com o carioca Afrânio da Costa e bronze por equipe, integrada ainda por Sebastião Wolf, que era de origem alemã, Fernando Soledade, natural do Rio, e o gaúcho Dario Barbosa.

Reparação

Apesar de sua conquista histórica, Guilherme Paraense ainda não recebeu o reconhecimento apropriado por sua proeza, embora existam registros de uma homenagem realizada pelo presidente Epitácio Pessoa (1865-1942). De acordo com um comovente artigo intitulado “Guilherme Paraense – O Herói Esquecido”, disponível na internet, seu bisneto André Luis Ogando Paraense afirma que a maioria das homenagens ocorreu de forma póstuma. Ele observa que Paraense é lembrado esporadicamente, especialmente durante os Jogos Olímpicos, a cada quatro anos. Contudo, uma proposta parlamentar em Brasília pode corrigir essa situação histórica.

O escritor, cineasta, roteirista e jornalista paulista José Roberto Torero, 60, autor do videodocumentário “Ouro, Prata, Bronze e... Chumbo!”, que narra a complicada jornada da equipe brasileira em Antuérpia, defende que o atleta receba um título nacional. “É simbólico que o patrono do Esporte Olímpico Brasileiro seja Guilherme Paraense”, declarou ao Roma News. “Ele não venceu apenas adversários, mas também enfrentou uma viagem difícil, onde teve que abandonar o navio e completar o trajeto de trem, além de precisar de armas emprestadas para conquistar sua vitória. Sua história é verdadeiramente épica, ou melhor, olímpica.”

A perspectiva de reconhecimento público pelo Congresso Nacional animou os familiares de Guilherme Paraense. “Todo reconhecimento ao feito do meu avô é valioso e importante”, afirmou o jornalista Eric Paraense, 59, neto do atleta, que reside em São Paulo. O pai dele, Oziris, e a irmã Cristiana visitaram Belém em 2016, para a inauguração da “Arena Guilherme Paraense”, conhecida como “Mangueirinho”. Oziris faleceu em 2022, aos 92 anos.

A neta Valéria Paraense, 69, odontóloga aposentada, também comemorou: “Achei excelente a proposta. Sendo ele a primeira página da história olímpica do Brasil, nada mais justo que ele seja o patrono do esporte olímpico.” Valéria, residente no Rio de Janeiro, acrescenta: “É uma homenagem justa não apenas pelo feito, mas pela pessoa que ele era. Só quem conviveu com ele pode realmente compreender a magnitude dessa homenagem. Ele merece ser eternizado na história do esporte olímpico brasileiro.”

Valéria refutou um mito sobre a emprestagem de armas por atletas norte-americanos. “Essa história de armas emprestadas é um mito”, garantiu. “O que os americanos forneceram foram munições, não armas. A arma usada por meu avô era dele.”

Valéria também revelou que a arma, um modelo Colt, e as duas medalhas de Guilherme Paraense – ouro individual e bronze por equipe – não serão vendidas. “Nunca venderia nada do meu avô”, afirmou. “Quando minha mãe não estiver mais aqui, vou doar para a Academia Militar das Agulhas Negras, onde há o Museu do Tiro, ou para o museu no Forte da Urca, que tem um busto dele. Um desses locais receberá as armas e medalhas.”

Tributos

Guilherme Paraense, nascido em 25 de junho de 1884 em Belém e falecido em 18 de abril de 1968 no Rio de Janeiro, recebeu homenagens póstumas da Academia das Agulhas Negras e do Museu do Desporto do Exército. Em 1989, o Exército nomeou o conjunto de estandes de tiro da Aman, em Resende, como “Polígono de Tiro Tenente Guilherme Paraense”. Em 2020, foi inaugurado um busto em sua homenagem no Centro Nacional de Tiro Esportivo durante o Campeonato Brasileiro de Tiro Esportivo, realizado no Centro Militar de Tiro Esportivo em Deodoro, no Rio. Além disso, foram lançados um selo e uma moeda comemorativos pelo centenário de sua conquista na Bélgica.

“Guilherme Paraense merece, sim, o título de Patrono do Esporte Olímpico nacional. Viva Guilherme Paraense, herói brasileiro!” celebrou o coronel de Infantaria Joel Francisco Corrêa, membro do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) e presidente da ArtMilFortBrasil. Ele foi o idealizador e curador da exposição no Museu do Desporto na Urca.

Em Belém, no dia 21 de outubro de 2016, foi inaugurada a Arena Guilherme Paraense, um importante centro esportivo do país, popularmente conhecido como “Mangueirinho” devido à sua proximidade com o Estádio Olímpico do Pará, o “Mangueirão”.

*Com informações do jornalista Roberto Rodrigues