Atlas da Amazônia brasileira expõe realidade da floresta

Organizada pela fundação alemã Heinrich Böll, publicação ecoa vozes amazônicas por resistência.

Publicado em 24 de abril de 2025 às 18:55

(O evento de lançamento contou com a presença de acadêmicos, ativistas, gestores públicos e parlamentares.)
(O evento de lançamento contou com a presença de acadêmicos, ativistas, gestores públicos e parlamentares.) Crédito: Foto: Nailana Thiely

Resistência e existência na Amazônia são as palavras centrais dos 32 artigos do Atlas da Amazônia Brasileira lançado na quarta-feira (23), na Casa Balaio, em Belém. Produzido e editado pela Fundação Heinrich Böll, organização política alemã com escritórios em 36 países, o trabalho reúne dados e saberes da maior floresta tropical do mundo e propõe uma reflexão sobre a diversidade de conhecimento que existe na região.

O evento de lançamento contou com a presença de acadêmicos, ativistas, gestores públicos e parlamentares. Duas mesas de diálogos reuniram autores do Atlas, membros do Conselho Editorial e convidados para discutir o protagonismo amazônida na crise climática e as perspectivas para a COP 30 - a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas no Brasil, que ocorre em novembro na capital paraense.

A diretora da Fundação Heinrich Böll no Brasil, Regine Schönenberg, disse que o Atlas da Amazônia Brasileira compõe uma série da fundação. “Já produzimos Atlas sobre agrotóxicos, plástico, entre outros. O documento será traduzido para outras línguas como inglês e espanhol, com foco na COP 30, e já até interesse de uma tradução para a Coreia do Sul”, informou Regine.

Ao contrário do percurso convencional, observou Regine Schönenberg, em que a produção se dá de fora para dentro, o Atlas da Amazônia Brasileira foi produzido na Amazônia. “O Atlas deixa as pessoas do território falarem sobre a sua região. Isso é importante porque abre todo um mundo de conhecimento que não se vê, porque normalmente outras pessoas vêm para a Amazônia e falam sobre a Amazônia”, destacou.

O Atlas tem marca objetiva, disse Regine, com dados e gráficos que foram checados e podem ser citados como instrumentos para a compreensão da realidade da Amazônia. Ao lado da produção científica qualificada, a publicação apresenta uma mudança de perspectiva. “Isso é único. São 32 artigos em que todos os atores propuseram perspectivas importantes”, disse Regine. “Nós formamos um conselho editorial com cientistas, indígenas, quilombolas, diferentes pessoas que se uniram para discutir o que é conhecimento e quem define o conceito de conhecimento.”

Uma das organizadoras da edição, a jornalista e pesquisadora Julia Dolce destacou que o Atlas pretende colaborar para a compreensão das complexidades da região amazônica e fazer ecoar as vozes da luta por direitos territoriais de povos e comunidades tradicionais diante de conflitos e ameaças. “O Atlas é uma coletânea de artigos curtos, em linguagem didática, sobre um determinado tema ou setor. Um dos objetivos é fortalecer a produção de conhecimento e o compartilhamento de saberes de especialistas amazônicos, reforçando a centralidade dos movimentos e organizações locais, particularmente no ano de realização da COP 30 em Belém”, afirmou Julia.

Para o geógrafo Aiala Colares, doutor em Ciências do Desenvolvimento Socioambiental pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA-UFPA) e pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e da Rede de Observatórios em Segurança, o grande norte do Atlas da Amazônia Brasileira é a reunião de pessoas, pesquisadores e atores ligados aos movimentos sociais, que abordam vários temas sobre a Amazônia para pensar um modelo alternativo de desenvolvimento da região. “Resistência é a palavra central do trabalho. Nós vivemos um contexto com uma série de dinâmicas de conflito na região. Há décadas. E a gente precisa apresentar uma alternativa a esse modelo predatório, conservador neoliberal que traz uma lógica de violência”, assinalou.

A palavra resistência, entende Aiala, aparece conectada à palavra existência, em referência às populações indígenas, ribeirinhas, quilombolas, trabalhadores agrícolas, ambientalistas, todos aqueles que defendem a floresta e sua biodiversidade. “É central considerar o lugar de onde se fala sempre que há referência à Amazônia. Isso é estratégico. É falar daquilo que se vive. Nós estamos na periferia do capitalismo, em termos nacionais e globais. Esse trabalho faz com que as nossas vozes da Amazônia ecoem fora do território amazônico”, disse.

Serviço

O Atlas da Amazônia Brasileira pode ser acessado, gratuitamente, pelo site da Fundação Heinrich Böll, nos formatos impresso e digital.

Endereço eletrônico: https://br.boell.org/pt-br

SUB

Diálogos acendem discussões sobre meio ambiente e COP 30

O evento de lançamento do Atlas da Amazônia Brasileira, na Casa Balaio, em Belém, teve duas mesas de diálogos sobre a Amazônia. A professora Marcela Vecchione-Gonçalves, PhD em Relações Internacionais e pesquisadora do NAEA/UFPA e Grupo de Pesquisa ReExisTerra, disse que o Atlas tem como diferencial propor o debate coletivo sobre as complexidades da região de maneira territorializada. O documento, segundo a pesquisadora, ressalta a principal característica da região: a diversidade estrutural.

Doutoranda em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UNB), mestra em Ciências Biológicas, a bióloga, agricultora e ativista pelos direitos indígenas Raquel Tupinambá defendeu o conhecimento ancestral atemporal, fundado na oralidade, como uma forma alternativa de sobrevivência na floresta. “Os povos são a floresta. A solução somos nós, pela visão de mundo dos povos originários”, afirmou.

A deputada estadual Lívia Duarte (PSOL-PA) disse que a COP 30, se não sinaliza progressos na luta em defesa dos povos da Amazônia, pode ser uma boa oportunidade para que a sociedade se organize “para dizer não a muita coisa”. Entre elas, a diminuição de demarcação dos territórios indígenas e a exploração de petróleo nas águas amazônicas.

“O risco da exploração de combustíveis fósseis na Amazônia é total. Qual foi o país que se democratizou explorando combustíveis fósseis? Qual foi o pobre que saiu da linha da pobreza explorando combustíveis fósseis?”, questionou a deputada. “Nós só podemos lutar contra os combustíveis fósseis hoje. O amanhã não nos permitirá voltar a esse ponto.”

O advogado, professor e pesquisador José Heder Benatti, representante da Clínica de Direitos Humanos (CIDHA/UFPA), disse que a categoria que une todos os povos da Amazônia é o “comum concreto” de resistência na terra. “O comum reflete a diversidade de vidas. Não existe vida sem manter a diversidade, a floresta, os animais. O comum só se constrói com respeito à diversidade e à individualidade”, assinalou.

Benatti destacou que a história da humanidade é marcada pela cooperação. Para ele, esse princípio deve ser restaurado pelas sociedades contemporâneas.

“Historicamente, se a humanidade chegou hoje onde chegou, foi baseada na cooperação. Ao contrário da visão hoje colocada, que é da disputa e do consumo. É importante a gente começar a rever nossos conceitos para buscar uma nova forma de nos relacionarmos e de estar no mundo”, finalizou.

Sobre a Fundação Henrich Böll

A Fundação Heinrich Böll é uma organização política alemã, presente em 36países. Seus escritórios na América Latina têm um compromisso especial com as organizações da sociedade civil do campo crítico porque acreditam que essas são fundamentais para o fortalecimento democrático. Promover diálogos pela democracia e buscar a garantia dos direitos humanos; atuar em defesa da justiça socioambiental; defender os direitos das mulheres e se posicionar como antirracista são os valores que impulsionam as ideias e ações da Fundação.

No Brasil, a organização apoia projetos de diversas organizações da sociedade civil, organiza debates e produz publicações gratuitas. No campo da justiça socioambiental, busca fortalecer o debate público que alie a defesa do meio ambiente com a garantia dos direitos dos povos do campo e da floresta. Para mais informações, acesse https://br.boell.org/pt-br

Sobre a Casa Balaio

A Casa Balaio é um projeto exclusivo das agências Alter Conteúdo e Jambo Comunicação. Orientadas pelas diretrizes ESG (Ambiental, Social e Governança) e pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU), Alter e Jambo propõem a reunião de pessoas e marcas, na Casa Balaio, para a construção de redes em prol de um futuro mais sustentável, ambiental e socialmente justo, com foco na Amazônia.

Instalada em um casarão histórico na avenida Nazaré com a travessa Quintino Bocaiúva, na região central de Belém, a Casa Balaio é muito mais do que um espaço físico em área de grande importância urbana da capital paraense, informou a jornalista Rita Soares, Diretora de Atendimento e sócia-fundadora da Jambo.

“A Casa Balaio é um hub de inovação e criatividade no coração da Amazônia. Ao longo de 2025, será palco de eventos, workshops, gravações de podcasts e videocasts, expedições e ativações exclusivas que antecipam os grandes debates da COP 30 - a Conferência das Partes das Nações Unidas que trata da crise climática mundial”, destacou.

Para a jornalista Kelly Lima, sócia-fundadora e Diretora Executiva da Alter, a Casa Balaio é um espaço de articulação e inspiração que une cultura amazônica, sustentabilidade e inovação — antecipando os debates da COP 30 e conectando vozes que pensam e fazem a diferença. “Queremos que a Casa Balaio seja muito mais do que um ponto de encontro. Ela será um palco para ideias transformadoras e ações que impactam realidades”, destacou Kelly.